Em "Cuadros del Londres victoriano" estão reunidos onze crônicas de viagem produzidas por Natsume Soseki sob inspiração dos dois anos em que viveu em Londres. Algumas são factuais, diretas, escritas como apontamentos de um diário, pelo menos duas originalmente foram cartas enviadas a amigos no Japão, já outras têm tratamento diferente, mais literário, flertam com o conto, com a invenção. Os textos foram inicialmente publicados numa revista tradicional japonesa do início do século passado chamada Hototogisu e posteriormente reunidas em livro, entre 1901 e 1909. Cabe registrar que neste ano se comemora os cem anos de morte de Soseki. Os registros de Soseki são realmente vívidos, ele fala de suas experiências no cotidiano londrino com assombro e bom humor. Observador refinado ele consegue contrastar o impacto da experiência na vida londrina com as tradições japonesas. Ele nunca é invisível. Chama a atenção a presença de um rapaz baixo e "amarelo", que se expressa com educação, sempre economiza dinheiro para comprar livros, veste roupas ocidentais e tem uma curiosidade de criança por todas as coisas. Já registrei nesse blog quatro crônicas, pois foram publicadas em dois pequenos volumes que já li anteriormente ("Cartas de Londres" e "Diario de la bicicleta" num volume e "La Torre de Londres" e "El museu Carlyle" em outro). As demais ("Habitaciones"; "El olor del pasado", "Un cálido sueño", "Impresión", "Niebla", "Hace muito tiempo" e "El profesor Craig") li agora pela primeira vez. Essas sete narrativas são híbridas de realidade e sonho. Soseki decifra o complexo arranjo social de uma pensão da periferia; conhece um outro japonês expatriado, mas que vive em condições econômicas muito melhores que as dele; sonha com uma viagem numa carruagem pelas ruas de Londres; acompanha a multidão matinal de pessoas que se deslocam para trabalhar, mas o faz noutro ritmo, como se fosse um escolho perdido num mar raivoso; perde-se na noite londrina, encantado com os ruídos de máquinas e equipamentos urbanos; visita o campo de batalha de Killiecrankie (nas terras altas escocesas) e imagina as operações de guerra e deslocamentos daquele confronto sangrento; descreve as aulas de conversação que mantém com um respeitado especialista em Shakespeare. Quando os dois anos de bolsa de estudos acaba Soseki volta ao Japão com quinhentos livros de literatura inglesa na bagagem. Quem de nós, bibliófilos praticantes como Soseki, não voltou de uma viagem com malas cheias de livros que amávamos mais que os demais pertences que trazíamos? Que não acumulou experiências sem fim em viagens e não as decanta à luz dos livros de outros viajantes. Vale.
[início: 03/01/2016 - fim: 06/01/2016]
[início: 03/01/2016 - fim: 06/01/2016]
"Cuadros del Londres victoriano", Natsume Soseki, tradução de Fernando Ortega e Abel Vidal, ensaio de Jordi Fibla, Palma/España: José J. de Olañeta, Editor (coleccíon El Barquero), 1a.
edição (2014), brochura 13x21 cm., 209 págs., ISBN: 978-84-9716-913-4
[edição original: A la deriva por el espacio (1906) / El Cuco (1901-1903) / Piezas breves para dias largos (1909) (Tokyo: Hototogisu, ホトトギス]
Nenhum comentário:
Postar um comentário