Raquel Peláez é uma jornalista jovem (tem menos de quarenta anos) e mora em Madrid há poucos anos (ela nasceu em Ponferrada, cidade de Castilla y León - uma das comunidades autonômicas da Espanha - e radicou-se em Madrid em 2009). Durante uns anos ela manteve um blog no blogspot (de agosto de 2009 até maio de 2013), depois migrou para o wordpress, e manteve esse novo blog atualizado até junho de 2014. De qualquer forma sua ausência pode ser um justificada (ou ela está em suas férias de verão ou está desfrutando o fato de acabar de publicar esse seu livro de crônicas). Bueno. O livro é divertido. São 19 crônicas que falam de uma Madrid que foi apreendida por ela, ou seja, que ela aprendeu a conhecer, amar e criticar (claro, quem melhor para apontar os defeitos de um lugar se não aquele que chega descompromissado e sem referências). Não é um livro que sirva como guia de viagens, mas algo que pode divertir quem já conheça a cidade e saiba dos assuntos que dominam seu cotidiano. Peláez utiliza a técnica de contrastar a história, as lendas urbanas ou os antigos causos curiosos da cidade com os temas que estão nas páginas de jornais atualmente, ou seja, com o dia a dia dos cidadãos madrilleños de hoje. Por exemplo: numa crônica ela fala de "Juana, la loca" (a filha dos reis católicos espanhóis, do século XVI) e a imbecil proposta de uma nova lei de aborto (que ontem mesmo, por coincidência, foi retirada de pauta por falta de consenso - nem tudo está perdido); noutra ela fala da morte de um desportista madrilleño dos anos 1980 (Fernando Martín) e a construção da enorme autopista subterrânea (a M-30) que endividou Madrid até 2040; ou ainda em uma outra, onde ela descreve os subúrbios de Madrid e o histórico de endinheirados e famosos que ali se refugiaram nas últimas décadas; ou numa última, no qual o incêndio suspeito de um prédio (o edifício Windsor, em 2005, numa zona nobre da cidade) é discutido em paralelo a análise sobre o crescente controle social em bairros de baixa renda (onde moram sobretudo emigrantes recém chegados). A Madrid que se apresenta para os turistas oferecendo diversão e festas para todos os públicos, bares e restaurantes sempre cheios, arquitetura exuberante, consumo sofisticado e sua rica história também merece uma cota de comentários ora irônicos ora sarcásticos. Ela parece nos lembrar que nem tudo pode ser edulcorado por propaganda e promoções de agentes de turismo. Gostei muito de sua discussão sobre xenofobia e a análise de um quadro clássico de Goya (o "3 de mayo de 1808", que está no Prado) e também de um outro, onde ela fala dos arranha-céus que sempre são construídos prometendo revitalização de uma região mas não passam de ferramentas de lavagem de dinheiro. Ela discute o provincianismo, a autoestima da cidade, a mítica movida madrilleña, escreve cartas para seus gurus (David Summers, Javier Marías e Christina Rosenvinge). Enfim, o que Raquel Pelaéz oferece não é nem um pouco descartável (como seria de se esperar do fato dos textos terem se originado em um blog). De fato espero que ela volte a abastecê-lo com mais dessas furiosas impressões da cidade. Por fim, cabe deixar aqui o registro das maravilhas que são as ilustrações de Alfonso Zapico incluídas no livro.
[início: 18/09/2014 - fim: 22/09/2014]
"!Quemad Madrid!: O llevadme a la López Ibor", Raquel Peláez, ilustrações de Alfonso Zapico, Madrid: Libros del K.O., 1a. edição (2014), brochura 14x21,5 cm., 245 págs., ISBN: 978-84-16001-224
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