Apesar deste pequeno livro aparentemente ter sido escrito para alcançar o grande público não especialista em astronomia ou física, não estou certo se alguém sem um mínimo de treino nestes temas possa acompanhar os argumentos de seu autor, o cosmólogo Mário Novello. O livro é inegavelmente bem escrito e objetivo, incluindo um bom glossário dos termos mais fundamentais e também uma pequena bibliografia. Mas no fundo encontramos um texto bastante técnico em seus fundamentos, cujas proposições não podem ser recebidas sem uma devida reflexão (o que nem sempre um leigo pode fazer). O livro se equilibra entre os argumentos técnicos e muita especulação, que necessariamente não podem ser comprovadas experimentalmente hoje (ou, ao menos, não se encaixam no modelo hegemônico de representação do universo hoje). O que Novello discute é um modelo alternativo ao Big Bang, um modelo de cosmologia sem singularidade. Segundo ele os argumentos científicos favoráveis à teoria do big bang foram historicamente superestimados. Na teoria do big bang se entende a origem do universo a partir de um estado extremamente denso e quente. Esta origem é razoavelmente bem localizada no tempo (algo em torno de 13,73 bilhões de anos atrás). Mas há dez anos comprovou-se experimentalmente que o universo está acelerando sua expansão e isto implicou em uma espécie de adaptação do big bang para incluir o que se chama usualmente de energia escura (esta conversa mereceria um detalhamento melhor, mas o leitor curioso deve ler o livro, paciência). Novello argumenta que futuros resultados experimentais farão com que a comunidade científica volte a discutir a possibilidade do universo não ter tido origem em uma singularidade, associando o que identificamos hoje como um ponto singular a um mínimo local no horizonte visível do universo. Ele discute brevemente as propriedades não convencionais do espaço tempo, as possibilidades de formas de energia exóticas, faz um catálogo de cosmologias alternativas. O livro funciona bem como um convite à reflexão sobre estes temas, mas trata-se de uma tarefa árdua (e que certamente não alcançará respostas definitivas tão cedo - como sempre acontece na ciência afinal de conta, pois sua força reside na capacidade de aceitar novos resultados experimentais, novos argumentos e reciclar-se, construindo sempre modelos novos, modelos mais acurados, modelos mais precisos). O livro inclui dois apêndices. Um é uma cronologia breve da cosmologia (muito breve mesmo) e outro um diálogo algo ficcionalizado onde parte dos argumentos do livro são apresentados com a estrutura utilizada por Galileu no seu "Diálogo sobre os dois principais sistemas do mundo" (há algo de pretensioso nisto, pois ele enfatiza que estamos vivendo um momento tão seminal quanto aquele experimentado no início da ciência moderna e não sei bem se esta forma de argumentar ajuda ou atrapalha a discussão apresentada no corpo principal do livro). Eppur si mouve! Vamos ao próximo livro. [início 19/06/2010 - fim 06/07/2010]
"Do bing bang ao universo eterno", Mário Novello, editora Jorge Zahar, 1a. edição (2010), brochura 14x21 cm, 130 págs. ISBN: 978-85-378-0237-3
Um comentário:
Aguinaldo Medici,
O livro de Mário Novello - Do Big ao Universo Eterno - tem realmente as características que você menciona em sua resenha. Eu já havia lido um outro livro dele - O Que é Cosmologia - e tentei ler também mais outro - Teoria do Universo Eterno. Mas este não foi publicado no Brasil, teria sido editado na França. Mário Novello é um dos poucos cosmólogos que questionam a Teoria do Big Bang. Ela não difere muito da Criação do Gênese. A diferença está no tempo: nesta última o tempo são sete dias, enquanto no Big Bang seriam milionésimos de segundo, tudo a partir de um ponto quase Zero, o "átomo primordial". Tendo sido defendida por um teólogo-matemático, George Lemaître, foi posteriormente sancionada até pelo Papa de então, em 1927. O certo é que o Big Bang, de mito passou a ser quase um dogma entre os cientistas, apesar de poucos terem examinado o assunto mais a fundo. Sobre o livro - Do Big Bang ao Universo Eterno - resenhas como a sua contribuem para a divulgação, não só da obra como do assunto. Pois essa história de "átomo primordial" conflita com a Teoria dos Buracos Negros, a que se reduziriam as estrelas massivas, de onde nem a luz pode escapar. O Big Bang conflita também com a Lei da Conservação da Matéria - nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.
Parabens pelo seu texto. Assis Utsch (autor de O Garoto Que Queria Ser Deus)
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