Nos livros de Antonio Tabucchi sempre alguém viaja e com esse alguém segue o leitor. No caso das histórias reunidas em "Mulher de Porto Pim" o destino dos sucessos é o Arquipélago dos Açores, o conjunto de nove ilhas que forma a parte mais a oeste de Portugal (O italiano Tabucchi teve uma relação especial com Portugal, viveu lá muitos anos, tornou-se um especialista em Fernando Pessoa, traduziu autores portugueses e italianos de uma língua para a outra, encantou-se com o lugar, ou melhor, com os muitos lugares que chamamos de Portugal). Para simplificar vou classificar esse livro como de contos, mas como sempre acontece com Tabucchi há algo cifrado em seu estilo. Algumas histórias parecem crônicas de viagem, registros objetivos de uma sensação, de uma experiência. Noutras o leitor se convence da pura invenção, da realidade de uma ficção curiosa, das habilidades de um autor criativo. Enfim, são oito narrativas curtas. Lemos sobre um homem que imagina uma nova Grécia nos Açores, com deuses, mitos e heróis; a história de um casal entreouvida num barco, sem início ou fim; o censo dos bares de uma das ilhas dos Açores, lugares construídos com restos de naufrágios, destino de deserdados e solitários do mundo; o resumo rápido da vida do poeta Antero de Quental, filho da Ilha de São Miguel, nos Açores. Encontramos também duas crônicas sobre a caça as baleias: uma delas quase científica, produzida dos fragmentos de diversos autores que já se interessaram pelo assunto; a segunda inventiva, na qual um narrador acompanha o capitão de longo curso de um barco baleeiro e as façanhas que resultam na morte de uma grande baleia (como se fosse a última de sua espécie a ser cruelmente abatida, como se apenas um réquiem nos redimisse da culpa). O conto que dá nome ao livro é a história de amor e morte que um velho músico de uma taberna das ilhas conta para um ouvinte curioso (sempre aquele sujeito que nas histórias de Tabucchi está no local certo para experimentar algo transcendental). O livro termina com uma história contada por uma baleia, que vê os homens na praia e estranha o comportamento daqueles seres bizarros e tristes. Especial. O leitor termina o livro e já se imagina num cais, preparando-se para zarpar rumo àquelas ilhas. Livro para se ler com calma, ouvindo o barulho do mar e do vento, dos peixes e dos pássaros. Vale.
[início: 21/12/2016 - fim: 22/12/2016]
"Mulher de Porto Pin e outras histórias", Antonio Tabucchi, tradução de Maria Emília Marques Mano, Alfragide/Portugal: Publicações Dom Quixote (Grupo LeYa), 1a. edição (2016), capa-dura 12x19 cm., 126 págs., ISBN: 978-972-20-6017-2 [edição original: Donna di Porto Pim (Palermo/Italia: Sellerio Editore ) 1983]
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